Uma vez por ano ao menos eu sou obrigado a ir a lugares com grande concentração de pessoas, e isso para mim, xenofóbico que sou, se torna uma grande aventura.
A começar pelas filas. Como o povo gosta de uma fila. Antes mesmo de estacionar, uma fila enorme de carros para passar no guichê do estacionamento. Eu, resolvi espiar aquele espaço livre e descobri outro guichê aberto, vazio. Mas o povo queria mesmo é ficar na fila do que estava cheio.
E pra quem gosta de fila, nada melhor que banco ou Poupa Tempo. E aquela menina que entrou no lugar errado tenta explicar a fila do guichê do estacionamento: “Aqui é só para preferenciais, senhora”, retruca a atendente. Sim, senhora, ou você acha que estamos todos nessa fila por que somos idiotas enquanto a outra fila está vazia!? Espertona… Mas la fora eu fui espertão. Será que os carros achavam que o outro guichê vazio era preferencial também?
Enfim, senti algo encostando em minhas costas. Pensei ser um jornal ou uma folha de papel segurada pela pessoa de trás, mas não… Era um celular! Sim, um celular! Imaginem a distância que esse indivíduo gordo e grisalho estava de mim para encostar o celular em minhas costas. Poxa, você não precisa preencher todos os centímetros da fila, e encostar no cara da frente não fará a fila andar mais rápido.
Pensei em anotar na minha agenda para no próximo ano ficar sem tomar banho uns 2 dias antes. Quem sabe fétido, as pessoas não fiquem tão próximas de mim.
Saindo dali, já que estava disposto, resolvi fazer compras no shopping e a escada rolante. Ah, a escada rolante! Não há nada mais perfeito para quem gosta de filas do que uma escada rolante. A fila que sobe e anda sozinha enquanto você, pomposo pode ficar em pé, de pernas abertas, admirando a paisagem passante.
Eu nunca fui pro exterior, mas nem precisa ir para perceber e ter o mínimo de bom senso de que nem todo mundo tem tempo e paciência de ficar esperando a escada rolante rolar. Por favor, se você é adepto de filas e sedentário a ponto de não poder subir 10 degraus, fique do lado direito da escada rolante e me deixa passar, pô!
Sem contar a música! Eu não gosto da música que você gosta. E graças ao bom Pai algum gênio já inventou um negocinho chamado fone de ouvido que custa baratinho em qualquer camelô. Desliga essa música infernal do seu celular ou ao menos coloca um fone de ouvido.
Musica em celular. Poxa, eu to ficando mesmo velho. Na minha época o celular era um telefone e não um walkman. E paradoxalmente ao que eu reclamo anteriormente, me espanta a mulecada de hoje em dia alienada com seus fones de ouvidos.
Na minha época o máximo de alienação que tinhamos era a tv. A família deixou de conversar por causa da tv. Mas agora não é só a família que não conversa. Ninguém mais conversa! Nem os amigos. Todos estão alienados com suas próprias músicas poluindo o ambiente ou vetados em fones de ouvidos.
O máximo de interação que eles tem é o compartilhamento do mesmo fone de ouvido: Hei, caramba, eu quero passar! Vocês podem ficar mais coladinhos, pois o fio do fone saindo do bolso de um para a orelha do outro ta fazendo um cordão de isolamento, arrastando tudo o que vê pela frente…
É claro que tanta alienação provoca uma situação oposta, pessoas totalmente diferentes, a reação da causa. O cara encostando o celular nas minhas costas por exemplo. Estava ali, carente, procurando algum calor humano. Tão próximo de mim e resmungando coisas pra alguém responder. Tentando puxar papo, mas com uma certa timidez em ser direto com alguém. Falava pra todos ouvirem.
Foi salvo por um velhinho. Sim, velhinhos adoram jogar conversa fora. E foram felizes papeando pelo resto da fila. O senhorzinho que parou seu carro próximo da entrada, em sua vaga exclusiva para idosos, não queria pegar a fila igualmente exclusiva, pois ele não tinha mais nada a fazer no resto do dia, e o filme da Sessão da Tarde não o agradava. Então optou por ficar na fila convencional, tomando o tempo dos outros que estavam ali por necessidade.
E assim vão caminhando, o povo e suas sacolas. Mundos individuais que se chocam e se provocam com suas neuroses e paranoias. Ano que vem a gente se vê.
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1 Comment
Hahaha…otimo texto. Sou xenofobica tb….esse mundo de sacolas e celulares com musicas, de filas e aglomeracoes me deprimem muito…bom mesmo eh minha casa, meu quarto…la tenho tudo que preciso, meu mundo.