Blumenau vai se adaptando as minhas expectativas. Pontos agradáveis vão surgindo sobre a nébula das aflições de perceber que não era o que eu esperava.
O lençol da cama aos poucos vai tomando meu cheiro, minhas ideias vão aos poucos se mesclando ao coletivo, ou em algumas ocasiões, colocadas sob o lençol, pra ficar ali só pra mim.
Paradoxos, contradições, ideias engessadas. É difícil conviver com pessoas assim. O meu trabalho constante é me livrar do ego, evitando a armadilha de me gabar disso, pois seria um contra-senso. E me parece que o que mais rola aqui é esse contra-senso.
Ainda assim, o lugar se molda à minha percepção.
As pessoas são interessantes em suas diversidades. E viver num coletivo como um hostel te faz ter que conviver com essas diversidades da maneira mais dura, num exercício foda de observação, gritos e alguns silêncios, para sua própria sobrevivência.
Tive conversas enriquecedoras, outras nem tanto. Em algumas eu falei muito, em outras apenas escutei, ora por que tinha algo a aprender, ora por perceber uma surdez intelectual. As vezes eu até disse alguma coisa que a pessoa parecia sequer ouvir, mas foi tipo aquela sementinha, que vc enterra sem perspectivas de geminar, mas segura um ‘quem sabe’ em pensamento.
Também há os ‘treteiros’, irresponsáveis e desrespeitosos. O cara que eu já pedi quatro vezes para não dar comida para a Samanta, e mesmo assim dá, olhando pra mim com um sorriso sarcástico no rosto. Provocando, irritando.
E ai, eu retomo todo meus estudos sobre energias, pra entender por que ele quer me agredir. Seria uma inveja da minha cachorra, uma busca por um sentimento de pequena posse do animal, ou é só pra azucrinar mesmo? Uma questão cultural da falta de respeito e individualidade egoista, como faz quando aumenta um pouco mais o som daquele forró eletrobrega insuportável, logo depois que eu pedi educadamente pra abaixar.
Só saio de perto, vou andar com a Sam em algum cômodo que o som não chegue. Então me pergunto se lhe dei a vitória ou se lhe frustrei por não lhe dar a energia da agressão que ele busca.
O fato é real, mas é só um simbolismo de todas as outras ações e reações que estou vivendo aqui. Observar, tentar entender, e se não conseguir, tentar abstrair.
Existem pessoas boas aqui. Alguns conceitos preconcebidos foram frustrados também, e eu assumi mea culpa ao admirar características de pessoas que eu julguei mal anteriormente.
Então eu retomo pra mim a responsabilidade de tudo. Por que eu devo ser prejulgado também, por todos aqui. Sou o cara de direita, o único com carro, que tem um mac e iphone, capitalista, narcisista, dono da razão, com uma cachorra fresca que nem pode comer batata frita, que fica pedindo pra abaixar o som por que julga que meu gosto musical é melhor que o seu. Será? Talvez sim. E devo me importar?
Talvez ninguém se importe. Pelo vaso sanitário a gente percebe que ninguém se importa. Mijo pra fora pois não sou eu quem limpo? Estupidez…
Mas tirando isso, está tudo bem.
Eu não limpo mais os banheiros, pois minha função foi mudada. Consegui que o trabalho de troca sobre minha hospedagem fosse mudado para algo relacionado a minha área. Estou arrumando o site do Hostel, bem como a identidade visual interna e algumas dicas de administração, parecido com o que fiz em Ubatuba.
Isso já me dá um certo conforto pra prosseguir por aqui, abstraindo a alienação e ignorância de quem precisa provocar pra ter atenção, ou quem prefere o conforto de seus antigos problemas.
Pernas engessadas te mantém de pé, mas não te permitem caminhar.
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2 Comments
Olha, eu na minha individualidade plena, jamais conseguiria aceitar alguém dando comida para meu cachorro sem meu consentimento. E som alto… É um grande dilema pra mim.
Acho que por tantas coisas aparentemente pequenas dificilmente conseguiria viver em hostel.
Tenho um certo espírito assassino em mim. Rs
Não vi nada de direita e capitalista nessa aventura pelo contrário , vejo liberdade , busca , aprendizado e retribuição!