_”Você está sorrindo” _ disse ela com certo estranhamento _ “parece mais leve…”
Ele sorriu ainda mais e respondeu: “sim, estou, pois não está mais doendo”.
Ela sorriu de volta e relaxou em seus cuidados. Enfim poderia descansar um pouco e cuidar de sua vida. A tempos sofria com uma entrega total a ele, para cuida-lo, para fazer com que suas dores fossem mais amênas.
Chegaram a brigar algumas vezes em que ela perdeu a paciência. Ele não conseguia fazer nada sozinho, era indefeso, inseguro. Se ela se ausentasse por um tempo mais longo, ele se perdia. Mesmo que se ausentasse para fazer coisas para ele mesmo. Fazer compras, limpar a casa. Ele gritava do quarto, esbravejava pois queria que ela estivesse sempre ao seu lado.
Certa vez ela realmente perdeu a paciência. “Eu tenho minha vida, eu preciso sair, pois se eu não cuidar da minha vida, não consigo cuidar de você!”. Ele ficou em silêncio, olhando fixo para seus olhos zangados e frios. Suas sobrancelhas abaixaram como um cão indefeso, e então virou para o lado escondendo a tristeza de sua impotência.
Ele nunca soube se ela sofria escondido. Pois pra ele, ela se mantinha fria. Neste dia, ela saiu do quarto e foi mesmo fazer o que achava que tinha que ser feito. Não procurou vira-lo de volta, saber se chorava ou se irava. Apenas saiu do quarto. Ela era assim. Uma fortaleza, um trem veloz que corria num trilho fixo passando por cima de qualquer obstáculo.
Ele não fazia questão de nada além de estar com ela. A casa podia estar suja, a geladeira vazia. Ele só queria ela ali do lado, todo o tempo do mundo, todo o tempo que o restasse. Pois ele não sabia quanto tempo restava.
A paixão é um fardo pesado e apenas abraços e palavras constantes o deixavam bem, todo o resto era inútil, lhe parecia dissimulação. Ele achava que era uma espécie de fuga, pois sabia o quanto era difícil estar ali ao seu lado constantemente.
Mas esse dia, ela enfim respirou. Ela entrou no quarto e ele não estava com sua cara de dó, pedinte apaixonado. Seu olhar brilhava um brilho diferente e ele tinha um breve sorriso no rosto.
_ Você está sorrindo, parece mais leve…
_ Sim, estou, pois não está mais doendo.
_ Sério!? Que bom.
Ela o abraçou e recebeu de volta um bom abraço. O abraço que lhe dava forças de continuar cuidando e que por não abraçar com tanta frequência que ela esquecia o por que estava ali e se cansava. Aquele abraço costumava lhe confortar quando ela cedia a ele, mas era tanto trabalho, que ela não costumava ir ali se recarregar. Não lembrava de quanto era bom.
_ Eu preciso sair.
_ Tudo bem. Vai lá _ respondeu ele mantendo seu sorriso no rosto.
Ela soltou seu abraço e o olhou com olhar de estranhamento, com um breve sorriso no rosto de agradecimento por sua aparente compreensão. Enfim parecia entender, estava mesmo tão leve.
_ Você está mesmo diferente. Que bom te ver bem assim. É bom não sentir esse peso. Vou sair, fazer o que tem que ser feito e volto. Não sei quanto tempo, mas tentarei ser breve.
_ Leve o tempo que for necessário. Eu estou bem.
E ela foi. Antes de fechar a porta, deu uma última olhada para trás, e ele continuava sorrindo.
Certa de que ele estava bem, ela aproveitou para fazer tudo o que precisava ser feito. No limite, extrapolando horas e atos. Correu pra cima e para baixo, trabalhou muito. Forçava não pensar nele para não atrapalhar seus trabalhos. Tinha que aproveitar aquele momento. E concluiu tudo o que estava pendente. A noite chegou e ela deitou em sua cama cansada de tanto trabalho. Preferiu nem ligar para ele. Se falariam no dia seguinte. Mas no dia seguinte, quando ela voltou, ele não estava mais lá…
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