_ Nós estamos em um casebre bem simples, a 50 metros do mar. Não tem mais músicas incomodando. Não tem nem gente por perto. Barulho só do vento nos coqueiros e das ondas quebrando. E alguns trovões, parece que vai chover.
_ Nossa, que romântico…
Começamos a rir. Por que ‘romântico’ não é uma palavra que define.
Nova Viçosa é um lugar totalmente diferente do que esperávamos. A praia, que estava a 50 metros de nosso casebre, era marrom, barrenta, invadida pelas águas turvas de um rio judiado por uma empresa que resolveu abri-lo para passar com seus navios carregados de madeira para fazer papel. Eu gosto de papeis, eu uso papeis para fazer meus desenhos, imagens e palavras.
Eu nem queria ir ao mar mesmo. Volto pro casebre mas não fico descalço pois o chão é sujo, melado, e já estava assim quando chegamos. Alias, quando chegamos, pensamos em nem ficar. Era uma casa de três quartos, mas apenas um estava em condições humanas de se dormir nele. Embora no canto tivesse uma pilha de mesas vermelhas da Itaipava, usadas no bar da frente em alta temporada. Tudo bem, a cama era box. Forramos com todos os panos e lençóis que haviam no carro. Até os sujos, pois ainda eram mais limpos do que o colchão e lençol disponibilizado pelo nobre anfitrião.
Começamos a rir quando minha mãe disse “que romântico” pois naquele momento, estávamos deitados na tal cama, centralizados em uma espécie de ninho formado pela breve lei da gravidade que afundava o colchão nos obrigando a ficarmos juntinhos. Romântico demais.
O banheiro era tão nojento quanto. Ao menos o chuveiro era quentinho. Mas era quentinho pois mal saia água então dava tempo de esquentar os pingos. E falando em pingos, eles começaram a cair lá fora. E logo agora que pensamos em lavar nossas roupas. Choveu! Choveu muito, nos obrigando a ficar quase todo o tempo dentro de casa.
Então usufruímos da única coisa que era realmente boa, em pleno sul da Bahia, numa paisagem pitoresca, exótica e surpreendente, a internet! Quarenta megas constantes via fibra que nos permitiu trabalhar bem, colocar as coisas em ordem e arrumar o nosso novo projeto: Mundiato!
Nova Viçosa foi uma experiência realmente diferente. Posso dizer que talvez foi o lugar mais inóspito e rude que eu passei em quase quatro anos de nomadismo. E parece que não sou o único a ter essa percepção.
Na beira da estrada, dos 30km que liga a cidade a Mucuri, sua vizinha mais próxima, existem inúmeras ruínas. Eu contei umas vinte, mas devem haver mais. De pequenas casas a verdadeiras mansões, de barzinhos a hotéis enormes, inteiros, com quartos e mais quartos expostos por janelas quebradas, totalmente abandonados. Alguns em ruínas, outros ruindo, e muitos ainda não. Apenas abandonados, abertos, com portas e janelas saqueadas. Um cenário de filme de ficção científica que se completa com muitos urubus figurando sobre aqueles tijolos desperdiçados.
Vontade de invadir, de montar acampamento em um deles. Talvez se limpássemos aquela mansão que entramos e montássemos nossa barraca, ficaríamos mais confortáveis do que no casebre na beira do mar.
Deixa pra lá, melhor limpar o casebre. Segura a onda, faz uma cuca e passa um café pra adoçar as tardes chuvosas. Temos uns aos outros e lá não terá internet…
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