
Toque da Lata
16 de junho de 2014
Parte do processo
26 de junho de 2014
Toque da Lata
16 de junho de 2014
Parte do processo
26 de junho de 2014Eu não quero emprego


_ Não, não. Com todo respeito, meu senhô. Se eu quisesse trabalho, eu pedia um emprego. Só quero mesmo um dinheirinho. Qualquer moeda que o senhô tenha ai em seu bolso.
É um dinheiro pra eu comprar uma pinga. Pinga mesmo, não é comida. Vocês acham engraçado nossa sinceridade, então estou sendo sincero. Esse humor sempre rende alguma coisa. É pra comprar pinga mesmo, pois pinga a gente não acha no lixo. Comida tem de monte. Só saber qual lixo procurar.
Tem muito lixo saboroso por ai. O senhor nem imagina. E limpo, viu! Lanche, marmitex, frutas. As vezes tem até refrigerante. Só tem que chegar na hora certa, pra não pegar o estragado. Desce fácil. Sustenta bem.
“Fome nóis não passa não”. Mas se fosse frio, a história muda. Com frio não dá pra brincar. Se aqui fosse frio, dai eu ia querer um emprego, uma identidade, pra ter uma moradia. Mas o Brasil é um país quente. Qualquer gramado vira uma cama corfortável. Tem umas pontes e praças que parecem feitas pra nos abrigar. Ou no litoral, a areia da praia. Moradia completa. Banheiros, sombras, com vista pro mar.
Tenho tudo o que preciso. Só falta um real pra pinga. E não tenho mais pois não quero cadastro no governo. Prefiro o anonimato. Se não eu teria até um ‘bolsa alguma coisa’.
_ Não tem nada mesmo, senhô? Nem déiz centavo? Tem problema não, vai com Deus.