As coisas não estão fáceis. Tempos difíceis de instabilidade financeira.
Samanta é obediente e agradável. Mas do nada, resolveu que faria xixi no lugar errado. No meio da sala, uma grande poça. E parece que sabia que tinha feito coisa errada. Quando eu olhei para a poça, ela já saiu rapidamente de perto de mim, ficou me assistindo dar bronca, de longe, com sua carinha de piedade.
Pouco dinheiro exige trabalho dobrado, e talvez eu tenha dado pouca atenção para ela. Embora toda hora eu paro e vou fazer um agrado, um afago, um abraço, jogar uma bolinha.
O frio e a chuva também tem impedido que eu lave a sacada (por que não seca). Tenho apenas passado um pano, e a fita que eu uso pra prender o jornal, não fixa. Resultado, um jornal esvoaçante. Tudo bem, ela faz fora do jornal mesmo, contanto que faça na varanta. Mas, parece que de birra, novamente fez dentro da sala e eu fiquei muito muito bravo, talvez mais bravo do que ela jamais me viu até então.
Já era de noite. A coloquei presa na varanda enquanto limpava o xixi errado. Ela olhava atentamente. Depois de poucos minutos, abri para ela entrar, e voltei ao trabalho. Ela deitou ao meu lado e dormiu, profundamente. Dormimos.
No dia seguinte acordei como de costume, com ela e suas patinhas sobre a cama, me lambendo, mostrando que estava tudo bem, sem remorsos pela bronca da noite anterior. Lavei meu rosto, coloquei minha roupa, com a cabeça a mil, só pensando nas contas impagáveis dos próximos dias.
Quando me dirigia a sala, ela teve sua atitude de culpa, correu de mim, parou longe e me olhou com aquele olhar, antes mesmo de eu ver o que ela havia feito. Ao chegar na sala, quatro cocôs, um deles no tapete, junto com uma mancha de xixi.
Meu sangue subiu a cabeça de maneira insalubre. É feio relatar isso, mas eu perdi totalmente o controle. Peguei ela pelo cangote, gritando muito, muito bravo, ela também gritou, chorou bastante. Embora estivesse fora de mim, não creio que a machuquei. A joguei na varanda de novo.
Meu coração estava disparado, meu sangue corria com força pelo meu corpo. Me sentei no chão e fiquei olhando aquele caos na sala, com ela ao fundo, presa na varanda. Respirei, respirei, respirei muito.
Nem tomei café. Peguei o balde, os panos, os produtos e comecei a limpar tudo. Ela assistia pelo vidro, chorando baixinho, querendo entrar.
Terminei de limpar, abri pra ela entrar, coloquei comida, tomei meu café em silêncio. Eu tinha que sair logo para um ensaio. Ela continuou me seguindo pela casa enquanto eu arrumava minhas coisas. Eu sentia um misto de raiva e dó, sem saber por que ela estava agindo daquela maneira. Sem saber se eu estava agindo certo. Querendo abraça-la, mas sentindo a necessidade de me manter firme na bronca.
Sai para ir trabalhar. Cabeça a mil. Remorso…
Quando voltei, ela veio até mim de levinho, com um certo medo, mas chegou perto, sentou e deu a patinha. Parecia querer pedir desculpas, e mesmo que seja só fantasia da minha cabeça, aceitei como se fosse, e a abracei.
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