O vidro da alma

Eu li em um poster na casa de um amigo um dizer que era mais ou menos assim “Em um mundo onde você pode ser qualquer coisa, escolha ser gentil”.

Todos nós somos limitados as barreiras de imposições sociais, somos conduzidos pelo manual das condutas tradicionais, onde temos que fazer o que nos mandam pra receber o que acham que merecemos, que geralmente é um valor monetário ou o ganho de um bem material.

Existe porém um movimento simples e fácil de ser executado, que quebra esse vidro fosco. Inclusive, nesse manual de condutas, está escrito que não devemos ou não somos capazes de quebrar esse vidro.

Mas em um dia ruim, onde tudo estava escuro e eu não sabia o que fazer eu escolhi ser gentil comigo mesmo, e em um movimento quase involuntário, distraído, eu quebrei esse vidro e então, como já estava quebrado, eu calmamente caminhei para o outro lado.

Do outro lado a gente aprende o verdadeiro valor de cada elemento do planeta. Aprende a reconhecer o que vale ou não a pena lutar e passa a lutar pelas coisas certas. Conseguimos olhar pra dentro de nós mesmos e nos entender, e dai, passamos a entender também a dor dos outros. Tudo passa a fazer tanto sentido que nada mais nos abala.

É claro que algumas coisas nos afetam, afinal, continuamos habitando esse corpo defectível, frágil e vulnerável, mas passada a tristeza ou raiva que essas coisas provocam, a gente consegue retomar nossa serenidade. Sobretudo pois conseguimos enxergar as dores e medos de quem tentou nos abalar.

Ouvi uma frase outro dia que dizia “o medo torna as pessoas más”. E isso é muito real.

Na véspera do momento em que escrevo esse texto, eu fui dilacerado por pessoas temerosas, que não conseguiram ainda perceber o real valor da vida. O mais incrível é que quando a gente se cura, nem mesmo as novas feridas se mantem. Minha dignidade não se altera, minha voz não muda de tom. Não há sequer uma palavra de ofensa  pra rebater todas as palavras ofensivas que me foram dirigidas. Por que eu me tornei maior do que tudo isso e diante de todas as possibilidades de ser qualquer coisa que eu queira, eu optei a ser gentil com quem está tão doente.

Isso me dá tanta paz, me traz tanto conforto e só fortalece ainda mais a possibilidade de continuar sendo quem eu escolhi ser.

Existe muita coisa no mundo que a gente nem faz ideia. Quando você olha pra si mesmo, você percebe algumas novas coisas. Quando você volta a olhar pra fora depois de olhar pra si mesmo, você percebe todo o resto e nunca mais consegue caber naquele espaço que se prendeu tanto, por tanto tempo.

Eu não tenho mágoa, ódio ou qualquer sentimento ruim por quem me agride. Tenho apenas compaixão e solicitude para amparar com amor todos que queiram também quebrar esse vidro.